Como analisar e entender uma imagem: uma leitura semiótica

8 out

Semiótica:

A semiótica foi criada por Charles Sanders Peirce, que formulou uma teoria geral para os signos, definindo-os como “algo que representa alguma coisa para alguém em algum lugar”.

Uma filosofia das significações que adota a mediação como principal questão de análise, a semiótica é a ciência que ajuda a interpretar a imagem e entender como ela transmite mensagens. Seu estudo explica que é o repertório visual e cultural de cada indivíduo que permite diferentes interpretações de uma mesma imagem, além do fato de esta depender do momento sócio cultural de uma sociedade. Por isso, são estabelecidas diferenças entre o significado e o sentido de uma imagem, no qual o primeiro refere-se a uma convenção estabelecida pelo senso comum e o último a algo pessoal e intransferível.

A semiótica tem por objeto de estudo qualquer sistema sígnico, portanto, pode-se analisar semioticamente tudo o que está ao nosso redor, pois, para esta ciência, tudo é passível de interpretação e tem um significado.

A imagem é um signo e, por isso, representa algo e precisa ser lida e decodificada, uma vez que ajuda construir sentidos para aquilo que se observa. Porém, é importante ressaltar que reconhecer um elemento de uma imagem não significa que e a estamos compreendendo e decodificando, pois o ser humano trabalha com formas simbólicas.

O fotojornalismo moderno nasceu com Erich Salomon na Alemanha no ano de 1930. A criação da revista LIFE nos Estados Unidos é um acontecimento que merece destaque, uma vez que caracteriza um momento importante que reiterou o fotojornalismo de guerra no fotojornalismo mundial. A grande reportagem passou a tomar conta das revistas e, por consequência, o fotógrafo passou a ser valorizado como um “contador de histórias”, já que a história passou a ser contada por várias imagens. Nos anos 80, surge um tipo de fotojornalismo engajado e ideológico e nos anos 90, aparece uma época de decadência do fotojornalismo mundial, na qual ele deixa de ser engajado e jornalístico, assumindo função estética publicitária e cineatográfica e a fotografia de imprensa retorna à posição de ilustração. Nas imagens jornalísticas dos últimos anos percebe-se a estética do espetáculo, característica da época atual. Vale ressaltar que apesar de a câmera fotográfica querer atuar como testemunha dos fatos, ela é, na verdade, criação daquilo que imaginamos como queremos que um fato seja representado.

Para a realização deste trabalho, selecionei a imagem de capa da revista Superinteressante como objeto de leitura para uma análise semiótica. A edição é de maio de 2009 e, apesar de trazer como imagem de capa uma montagem que causa impacto pelo paradoxo que representa, possibilita interessante análise semiótica.

Considerações acerca da imagem escolhida:

A priori, a imagem que traz a capa da revista é intrigante pelo fato de apresentar, em letras imponentes, a palavra “DIETAS” inserida na figura de uma barra de chocolate.

Curiosa, aproximei-me da imagem para observá-la de perto. Só assim pude perceber que em cada quadradinho de chocolate que compõe a barra do doce cita o nome popular de dietas inventadas, como “dieta dos pontos”, “dieta do arroz” e “dieta da lua”, intercalados com expressões como “Beverly Hills” e “South Beach”.

Ainda observando de perto a capa da revista, pude notar que a palavra “DIETAS” não é apresentada sozinha, uma vez que vem acompanhada da frase “A farsa das”. A partir de então, comecei compreender o porquê da representação de dieta numa barra de chocolate.

“Comer de 3 em 3 horas? Passar fome depois das 6 da tarde? A maioria das ideias sobre regime não faz sentido algum. Você realmente quer emagrecer? Então pergunte-nos como” é, também, uma frase que compõe a capa da revista.

Foi somente após a completa observação da imagem que muitas ideias surgiram em minha cabeça a fim de compreender seu significado. Neste momento, a partir de uma análise semiótica, pode-se afirmar que ocorreu o uso de meu repertório visual e cultural para a interpretação da imagem.

“É o repertório visual e cultural de cada indivíduo que permite diferentes interpretações de uma mesma imagem, além do fato de esta depender do momento sócio cultural de uma sociedade”:

A barra de chocolates opõe-se fortemente à idéia de dieta, fato que chamou minha atenção num primeiro instante. A leitura das frases que complementam a idéia da capa da revista permitiu melhor compreensão da intenção ali inserida.

Foi o meu repertório cultural e visual que me fez analisar a imagem a partir do contexto da sociedade em que estamos inseridos, a qual possui a característica de impor certos padrões de beleza que devem ser adotados pelos indivíduos para que sejam aceitos no meio em que vivem.

Essa questão gera polêmica à medida que, atualmente, o número de homens e de mulheres insatisfeitos com suas respectivas aparências é alarmante. Tais padrões são ditados pela sociedade capitalista através dos mais diversos meios de comunicação, como revistas e televisão, os quais apresentam modelos magérrimos que induzem os indivíduos acreditarem que só serão bem aceitos em seu meio se apresentarem figura semelhante àquela veiculada na mídia.

A partir da capa é, também, possível afirmar que a reportagem tem como alvo o público feminino, já que o assunto dieta manifesta-se, principalmente, entre esse grupo, devido às inúmeras razões já discutidas nesse texto. Estudos filosóficos afirmam que a forma magra foi rapidamente aceita pelas mulheres pelo fato de que este formato traz no inconsciente feminino um sentido libertador dos contornos arredondados que simbolizavam a maternidade e o papel reprodutor da mulher dos séculos passados.

As consequências dessa “ditadura” da beleza são devastadoras, uma vez que faz os indivíduos esquecerem da natureza do conceito de beleza, além de enfrentarem regimes torturantes que podem acarretar problemas como obsessão pela magreza, pela malhação, pelas cirurgias plásticas, pelos produtos de beleza, pela moda e, claro, pelas dietas. É necessária a conscientização de que são exatamente elas, quando feitas sem acompanhamento médico, sem orientações adequadas, de forma radical e sem necessidade, as principais causas de doenças como bulemia, anorexia, entre outros transtornos alimentares.       Vale ressaltar que o risco de as dietas não surtirem o efeito desejado pelo “praticante” – emagrecer com o intuito de enquadrar-se naquilo que a sociedade considera como belo – é enorme.

Interpretação da imagem selecionada e mensagem que ela pretende transmitir:

É nesse contexto que se insere as expressões inscritas nos quadradinhos de chocolate: “Beverly Hills” e “South Beach” referem-se à lugares populares por sua fama de ser freqüentado por homens e mulheres bonitos que ilustram, exatamente, o modelo firmado pela sociedade; já as “dietas populares” atuam, simultaneamente, como uma expressão alarmante e irônica acerca dos danos que podem trazer. “Vale a pena esquecer a modelo perfeita de outdoor” e “não dá para virar a Fernanda Lima quando o espelho mostrou sempre a silhueta de Preta Gil”, são frases do texto que confirmam tal alegação.

A imagem da capa traz o chocolate mordido. Considero esse elemento como o desejo de incentivar o leitor a negar padrões de beleza estabelecidos e as dietas populares, as quais, muitas vezes, constituem em mitos, e procurarem apoio profissional e apropriado para emagrecer e conquistar a figura almejada. A parte do texto que diz “Você realmente quer emagrecer? Então pergunte-nos como” traz implícita a idéia de que não condena os padrões estabelecidos pela sociedade, já que promove a credibilidade da revista como forma de ajuda confiável para o leitor ou leitora que almeja conquistar o peso desejado. Porém, a partir da leitura do texto, pode-se concluir que o que a revista pretende não é, como pensei a priori, substituir o papel de um “médico”, mas sim alertar os leitores dos perigos das dietas malucas e combatê-las, “detonando” os mitos que elas carregam consigo. As frases “Só vale fazer sacrifício se a questão for de saúde” e “dietas malucas são uma armadilha”, comprovam tais afirmações.

“Na balança, o que interessa é quantas calorias o alimento tem” e “pode comer de tudo”, “é proibido proibir” e “não precisa deixar de comer o que gosta, basta comer menos”, são frases do texto que adicionam à minha interpretação do chocolate mordido, a intenção de transmitir a mensagem de que é permitido comer doce, mesmo durante uma dieta, se as calorias ingeridas neste alimento forem compensadas com o não consumo de outros alimentos muito calóricos, a fim de manter um nível de calorias diárias adequadas.

Após a leitura da reportagem, pude constatar, também, que a matéria enfoca explicações científicas e biológicas a respeito do funcionamento do metabolismo humano e de como o corpo engorda e emagrece; abordagem que careceu na minha interpretação. Também posso afirmar que em minha leitura da imagem faltou tratar a questão da indústria da dieta, ao passo que meu foco voltou-se aos padrões de beleza impostos pela sociedade capitalista e, o da revista, apesar de também discutir esse assunto, deu maior atenção ao mercado das dietas e à indústria alimentícia, as quais atuam na sociedade sob as formas de vendas de livros e de empresas que utilizam esse elemento para promoverem-se. Nesse argumento, mais uma vez a revista mostrou-se disposta a detonar os mitos, alertando para que os leitores portem-se menos ingênuos e resistam à industria das dietas. A leitura do texto confirma, ainda, que minha análise deixou a desejar no que diz respeito à questão da fome como um processo psicológico que envolve, por exemplo, prazer, dificuldades emocionais, biológicas e sociais, insegurança, entre outros.

“Nos anos 90 aparece uma época de decadência do fotojornalismo mundial, na qual ele deixa de ser engajado e jornalístico, assumindo função estética publicitária e cineatográfica e a fotografia de imprensa retorna à posição de ilustração”.

Considerações finais:

Cabe nesta parte do trabalho dizer que concordo com a imagem trazida na capa desta edição da revista, pois esta permitiu uma boa interpretação da mensagem da reportagem. Embora minha análise tenha deixado a desejar em alguns quesitos, posso garantir que foi por precariedade de meu repertório cultural, uma vez que lida a matéria, pude compreender os significados que, a priori, não percebi. Afirmo, portanto, que, se tivesse autoridade, selecionaria, sim, esta imagem para representar a reportagem. Ressalvo apenas para o fato de que ela não traz elementos que induzam o leitor se informar de que o texto apresenta uma notável abordagem científica acerca do funcionamento do corpo humano.

capa da Revista "Superinteressante", maio de 2009

capa da Revista "Superinteressante", maio de 2009

Uma resposta to “Como analisar e entender uma imagem: uma leitura semiótica”

  1. Maria Martins setembro 29, 2011 às 4:12 pm #

    Gostaria de um pequeno histórico a seu respeito pois li seu texto para uma entrevista para mestrado. Obrigada.

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